Vestia um fato de saia e casaco preto. O ar à sua volta exalava Dior e a uns quantos pós que a mulher magicamente colocava na face para disfarçar imperfeições. A cidade escutava nesse instante o som adormecido dos sinos. A mulher entrou na igreja e procurou um banco vazio, sentou-se, ajeitou a saia, tocou no cabelo e ficou inerte respirando o ar húmido de todo aquele espaço. A luz entrava pelos vitrais das janelas dando contornos e luz diferentes às coisas, os santos todos à volta nas paredes em altares de luz cobertos a linho, estando parados era como se observassem todas as pessoas, parados era como se tivessem escolhido aquele lugar para se esconderem do mundo e decidido ficar naquela meia luz que não parecia vida mas ainda não era morte. A mulher tirou da mala um rosário negro que brilhou na sua mão, passou conta a conta, ajoelhou-se, beijou a cruz, rezou. Rezou pelo marido que não estava em casa e que deixava no coração da mulher uma falta imensa, rezou pelo filho que estudava no estrangeiro e que ligava ora quando fazia neve e só depois quando fazia sol. Rezou pela vizinha com quem partilhava um bule de chá quente, rezou por si e pelos sacrifícios de Cristo, pelo amor aos pobres e pela falta de amor no mundo. Sentia sempre, quando rezava, um aperto grande no coração, como se o rosário desse voltas e mais voltas no músculo e não existisse diferença visível no momento em que o coração batia e descansava, a mulher sabia que errava, sabia que pecava, sabia que dizia puta, as putas, os cabrões, dizia todas essas palavras para se entreter entre golos de chá com a vizinha, com quem ia partilhando os dias. Pedia perdão, e depois quando o coração ficava mais leve e ela sentia o rosário na mão e o deixava de sentir em qualquer outro local do corpo sabia que Deus tinha ouvido as suas palavras. A mulher sentia-se bem na igreja, não sabia se era por Deus estar ali, ou por ela estar ali a sós com ela própria, por ouvir o coração, pelo perdão de Deus ou principalmente pelo perdão dela. Rezava, todos os dias, na igreja, quando os sinos tocavam no ar beijando a cidade e abraçando todas as ruas. Terminava sempre as orações da mesma forma, que Deus me leve no mesmo dia da vizinha.
7/26/2010
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1 Comentários:
Muitas vezes o melhor esconderijo é mesmo a casa de Deus...às vezes também me escondo por lá!
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