O sol continha-se, escondia-se como quem conta segredos no embalo vago das palavras pequenas que dizem muito. Gabriel estava encostado a uma parede onde estavam desenhadas umas asas que lhe saíam das costas, como se na parede estivesse a continuação do corpo que a biologia impede de crescer em nós. A luz que se fazia sentir era perfumada, intensa. O ar era pesado e isso notava-se na respiração pausada no homem em forma de anjo visto ao longe. Gabriel pensava no amor e nas coisas todas que estão dentro dessa capacidade mais que humana
está a felicidade no amor? ou será o amor a única forma de felicidade?
as perguntas não procuravam respostas. Gabriel beijava as asas na parede iluminado pelos olhares distantes de quem passava. Não era um anjo, os anjos não amam
na morte só amam os humanos que ficam, os anjos apenas voam, mortos no ar suspensos pelas asas que ganham vida quando tudo o resto restolha a morte
dizia em voz alta, como se falasse para alguém que estando não estava, alguém que percebesse essas palavras, que visse nas asas desenhadas na parede a aparência de um corpo invisível, um corpo de anjo. Quando se afastou da parede onde antes estivera encostado, Gabriel não olhou para trás quando as asas começaram a desaparecer da parede. Sobre o corpo de Gabriel brilhava uma luz intensa que ia destoando do resto da luz que iluminava o resto do mundo, nos lábios do homem podiam ler-se as palavras mudas
eu amo-te, meu anjo. Mesmo que não possas amar-me, nunca mais.
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