4/11/2011

Os brilhos


A respiração tornara-se ofegante ao fim de dez minutos. O ar quente e pesado navegava pelo quarto pegando-se às paredes frias como se as tentasse embalar. A mulher tentava suster o sono no plano das coisas iminentes mas ainda não palpáveis. O candeeiro eclodia em brilhos e cheiros de almíscar e âmbar que junto à pele sabiam à casca dos velhos cedros que abraçavam a casa por fora e a mantinham afastada do mundo. A mulher deitada no chão olhava a bola de luz suspensa. Olhava os brilhos e lembrava-se dos dias em que um por um beijava os cristais frios de olhos fechados como se em cada brilho visse as tuas feições e o teu tacto suave. A luz, agora mais brilhante, lembra a tua morte encantada nesses tons amarelados que o candeeiro vai dando à casa e ao ar que está dentro da casa. A mulher nunca mais beijou os brilhos, agora apenas os retira um a um, um por dia, e os destrói, isso até ao dia em que sem brilhos o candeeiro comece a ser só luz, como se morresse, tal qual tu morreste, abraçado na luz, estilhaçado como um cristal que enforma a metáfora, o exagero enorme, que é o coração de todos nós.


Fotografia (linda) Sem Título por Daniela Ribeiro.


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