4/12/2011

Joana e a cadeira ao lado.



Joana tinha a idade de já não se ter idade. Era cega. Via as coisas a negro em cima de negro, lia as texturas e encontrava-se nas ruas de mãos dadas às paredes e todos os caminhos pareciam traçados pelos seus pés. Ia ao médico todas as semanas saber como estavam as coisas por dentro, tacteava os corredores do hospital e caminhava a uma velocidade que fazia franzir o sobrolho de quem olhava. Sentava-se na mesma cadeira, todos as terças feiras de todas as semanas e depois olhava para a direita como se fitasse os olhos de quem estava sentado a seu lado. A cadeira do lado, a cadeira do marido já morto. Cega é mais fácil acreditar que quem nos abandona nunca parte inteiramente, estando ao nosso lado sempre que acreditamos que está, por isso ela olha, por isso ela sorri, por isso vive, por isso vê sem ver e sabe, melhor que todos nós, de que sonhos é feito o amor.




Fotografia Sem Título por Daniela Ribeiro.

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